sábado, 14 de fevereiro de 2015

O porquê de um sistema de unidades de conservação

O que fazer quando se está no País com a maior biodiversidade do mundo para garantir novos avanços na área ambiental e evitar que as conquistas até hoje alcançadas sejam perdidas?

Em outubro, uma importante iniciativa foi lançada como resposta da sociedade a essa questão: a Coalizão Pró-Snuc, uma rede colaborativa de ONGs que busca unir esforços para complementar ações públicas relacionadas à criação e à manutenção de áreas protegidas no País. O objetivo é fortalecer um dos maiores avanços da legislação ambiental brasileira: o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (Snuc), instituído pela legislação em 2000.



Mesmo após mais de uma década, essa importante ferramenta ainda precisa ser consolidada e efetivamente aplicada na prática para enfrentar a evolução das ameaças à proteção da natureza. O Snuc foi criado para consolidar o papel e a gestão das unidades de conservação (UCs) no País. O objetivo é que elas sejam planejadas, criadas e administradas de forma integrada, com vistas à valorização de sua importância econômica e social, além da proteção de espécies, biomas e ecossistemas brasileiros.

Aos 14 anos, pode-se dizer que o Snuc é um dos melhores sistemas de áreas protegidas do mundo. Porém, apesar da grandiosidade e da importância, ele ainda passa por dificuldades, principalmente no tocante à universalização da proteção da biodiversidade e para integrar as unidades de conservação aos processos de desenvolvimento nacional, de modo que sejam percebidas e geridas estrategicamente.

Com relação à universalização e à efetiva proteção, as unidades de conservação possuem distribuição desigual pelo território do Brasil, não se estendendo a toda a variedade de biomas e ecossistemas nacionais. Além disso, exceto a Amazônia, todos os biomas brasileiros possuem menos de 10% de suas áreas protegidas, realidade distante das metas para 2020 definidas pelo Protocolo de Nagoya da Convenção da Diversidade Biológica (CDB), do qual o Brasil é signatário. Elas determinam que pelo menos 17% de áreas terrestres e de águas continentais, e 10% de áreas marinhas e costeiras deverão ser conservadas por meio de sistemas eficientes de áreas protegidas.

Estamos no caminho correto, mas a passos lentos – e às vezes incertos. Somados aos problemas de universalização, estão as dificuldades de gestão, que resultam na não implementação efetiva das unidades de conservação. Boa parte das UCs não dispõe de plano de manejo, enquanto outras que têm carecem de recursos humanos e financeiros para colocar as atividades previstas em prática.

Entre outros agravantes destaca-se a pouca importância a elas conferida no cenário nacional e a desinformação a respeito de seus benefícios. Afinal, por que os 200 milhões de brasileiros, incluindo os habitantes das granes cidades, devem se preocupar com áreas protegidas que às vezes ficam a centenas de quilômetros?

A resposta é simples, embora a maior parte das pessoas a desconheça. As unidades de conservação são importantíssimas não apenas para a proteção da biodiversidade, mas também indispensáveis para a vida e o bem-estar dos brasileiros. O aproveitamento não-extrativo desse patrimônio natural pode render muito mais ao País – por mais tempo e para mais pessoas – do que a mera utilização imediatista de recursos. Afinal, a natureza protegida fornece serviços ambientais essenciais à vida, e de grande valor, como o fornecimento de água limpa, a purificação do ar, a regulação do microclima e o sequestro de carbono.

As unidades de conservação também representam geração de renda para milhares de brasileiros, pois importantes pontos turísticos naturais de grande beleza cênica são protegidos em seus interiores. Porém, o turismo nas UCs brasileiras ainda é subaproveitado, como pôde ser percebido no Congresso Mundial de Parques, realizado em novembro, na Austrália: no evento foram apresentados casos internacionais interessantíssimos, como o de avistamento de baleias no Equador e da Grande Barreira de Coral da Austrália, que geram milhares de empregos diretos.

Para alcançar resultados mais expressivos, o Brasil precisa primeiro avançar na disseminação de informações sobre UCs para que as pessoas se aproximem dessas áreas, entendam suas funções e as visitem. Uma ferramenta que pode contribuir nesse caminho é o Wikiparques, a primeira enciclopédia colaborativa brasileira sobre parques nacionais e áreas protegidas, que também foi apresentada no Congresso Mundial de Parques.


Boas inciativas existem. O que falta agora é a sociedade e os governantes brasileiros entenderem que o estabelecimento e a implementação de um sistema de unidades de conservação são uma das principais estratégias para a conservação da biodiversidade. Além de ser essencial para a garantia do bem-estar da população e o desenvolvimento econômico do País. Quem sabe assim o Snuc seja priorizado na agenda pública e realmente consolidado – lembrando que a consolidação desse sistema passa pela ampliação do total de áreas protegidas no País, pelo incremento do orçamento das unidades de conservação nacionais e pela regularização fundiária daquelas que possuem pendências nesse sentido, conforme defende a Coalização Pró-UC.

Por Malu Nunes
Fonte: Diário da Manhã

domingo, 1 de fevereiro de 2015

Agenda ambiental não emplacou nas eleições. E agora, Brasil?

A festa (da democracia) acabou: novos chefes do executivo nacional e estadual escolhidos, além de deputados e senadores. E agora, José? Maria? Nordestino? Sulista? Brasileiro? Qual rota o país tomará para garantir o sucesso da fórmula que alia e harmoniza desenvolvimento econômico e conservação da natureza, equação cada vez mais óbvia quando o que está em jogo é o futuro das pessoas e das nações?


Não sabemos. Durante as eleições, pouco se falou sobre meio ambiente além do óbvio: que é preciso protegê-lo. Temas mais profundos relacionados à conservação de nosso patrimônio natural e indispensáveis para a garantia da qualidade de vida da população receberam pouca ou nenhuma atenção na pauta de discussões públicas.

Além de possíveis soluções e das implicações da severa crise hídrica pela qual passa o país, também ficaram em segundo plano discussões sobre o estabelecimento de uma política nacional de adaptação às mudanças climáticas e até mesmo sobre como estimular a pesquisa científica para preencher o imenso vazio de conhecimento a respeito de nossas áreas naturais nativas e das espécies que nelas existem.

Outro tema importantíssimo não contemplado foi a proteção e ampliação do Sistema Nacional de Unidades de Conservação. Mesmo após mais de uma década de criação e regulamentação, essa importante ferramenta ainda precisa ser consolidada e efetivamente aplicada na prática para enfrentar a evolução das ameaças à proteção da natureza no Brasil. Criado para consolidar o papel e a gestão das unidades de conservação (UCs) no país, essa lei tem como objetivo valorizar essas áreas protegidas, importantíssimas não apenas para a proteção da biodiversidade, mas também indispensáveis para a vida e o bem-estar dos brasileiros.

Elas fornecem serviços ambientais essenciais à vida, como o fornecimento de água limpa, a purificação do ar, a regulação do microclima e o sequestro de carbono. Também representam geração de renda para milhares de brasileiros, pois importantes pontos turísticos naturais de grande beleza cênica são protegidos em seus interiores, além de algumas UCs marinhas funcionarem como berçários para o desenvolvimento de peixes que poderão ser pescados fora de seus limites. Nem todos esses benefícios, porém, fizeram com que as unidades de conservação recebem a atenção merecida durante o processo eleitoral.

Diz o provérbio que não ser visto significa não ser lembrado. Podemos ir além: não lembrar implica em não priorizar. Finalizados os votos, baixadas as bandeiras partidárias, acalmada a mídia, fica agora uma sensação de vazio nessa questão: será que nos tornamos indiferentes à questão ambiental?

A mea culpa, nesse caso, cabe a quem? Aos eleitores que desconhecem o impacto da proteção da natureza em suas vidas e não exigiram propostas relacionadas ao assunto? À mídia que não levantou a pauta porque ela não suscitava interesse em seus públicos? Aos candidatos que despriorizaram o tema por acreditar que propostas relacionadas à conservação da natureza não se convertem em votos? Parece improvável que a responsabilidade recaia sobre um único grupo, mas é evidente e inquestionável que os resultados e impactos serão sentidos por todos. E então?

Por Malu Nunes
Fonte: O Eco